A cada cinco horas uma mulher morre devido a complicações gestacionais. Nesta sexta-feira (28), é lembrado o dia Nacional da Luta pela Redução da Mortalidade Materna
Desde o momento em que a mulher descobre que está grávida, a preocupação começa a ser parcelada entre mãe e bebê. Afinal de contas, existe uma nova vida a ser cuidada. No entanto, as preocupações em torno da criança podem ofuscar a verdadeira protagonista desse momento: a gestante.
Segundo dados levantados pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a cada cinco horas uma mulher morre por conta de complicações relacionadas à gestação, sendo durante a gravidez ou no puerpério, período de 42 dias após o parto. Os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde, de 2015 a 2019, mostram que a mortalidade materna registrou cerca de 1650 perdas de mulheres. As causas mais recorrentes apontadas na pesquisa foram, respectivamente; eclampsia (14%), hipertensão gestacional com proteinúria significativa (10,6%), hemorragia pós parto (10%) e infecção puerperal (5,8%).
Apesar de a data não ser muito divulgada – quem é da área da saúde certamente deve conhecer – hoje, 28 de maio, é um dia em que esta questão é levantada, é o Dia Nacional da Luta pela Redução da Mortalidade Materna.
Atualmente, o Brasil registra o dobro do número aceitável pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Para se ter uma ideia, o país tem uma média de 59,1 mortes maternas a cada 100 mil nascidos vivos, segundo o médico ginecologista Luiz Fernando Petrucce. Ele explica que existem várias causas para a mortalidade materna, e destaca hipertensão, infecções e hemorragias, como as principais delas. No entanto, Petruce ressalta: "A ordem dessas doenças é variável, de acordo com o local mundo". Segundo ele, em países mais vulneráveis, predomina a hemorragia. Já em locais mais desenvolvidos, a pressão alta ganha das demais.
Uma pesquisa do DataFolha de 2019 mostrou que 13% das brasileiras não realizam consultas ginecológicas. Já as que buscam, a idade da primeira consulta era em média de 20 anos, geralmente por suspeita ou quadro de gravidez. Entretanto, 12,8% das mortes maternas registradas pelo Ministério da Saúde são de meninas e mulheres de 10 a 19 anos, ou seja, que não procuraram ou não puderam, ter um tratamento adequado. E segundo o ginecologista Luiz Fernando Petrucce, do Hospital Anchieta de Brasília, o óbito de mulheres grávidas e puérperas pode ser facilmente evitado com "uma atenção de saúde precoce ou acesso aos serviços de saúde". "Em geral, essas doenças podem levar à mortalidade, mas 90% dos óbitos seriam evitáveis com um sistema de saúde bem estruturado", argumenta.
Na opinião do obstetra Dr. Marcos Nakamura Pereira, presidente da Comissão Nacional Especializada em Mortalidade Materna da Febrasgo, o planejamento da gestação e o pré-natal têm papel primordial para a prevenção da mortalidade materna. Fornecido pelo SUS (Sistema Básico de Saúde), o pré-natal se trata do acompanhamento médico que deve ser iniciado imediatamente após a descoberta de uma gestação. Ao contrário do imaginário popular, o pré-natal é abrangente, e não se resume às questões fisiológicas, mas considera o corpo integral da mulher, ou seja, o seu desenvolvimento, saúde mental e rede de apoio dentro e fora de casa.
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É preciso de mais visibilidade
"O Dia Nacional da Luta pela Redução da Mortalidade, eu acho que, não só o dia em si, mas o tema todo, é muito pouco explorado e muito pouco falado. Muito pouco se fala em mortalidade materna porque a qualidade da assistência que se presta a essas mulheres expõe as fragilidades do nosso sistema", diz Petrucce.
Segundo o ginecologista, no Brasil, a principal causa de mortalidade é pressão alta desde meados dos anos 1980. No entanto, nada melhorou até agora. "Há mais de 40 anos estamos registrando em torno de 60 mortes maternas para cada 100 mil nascimentos, esse número já tem muito tempo que não tem queda", aponta. Com isso, a importância de conscientizar a sociedade em torno do assunto se torna cada vez mais urgente e alarmante.
"Explorar esse tema expõe a fragilidade do nosso sistema, o quanto ele está mal estruturado, o quanto nós precisamos avançar, não só enquanto sistema de saúde, mas enquanto sociedade também de cultura. Eu acredito muito que a razão é uma questão estrutural." (Luiz Fernando Petrucce)
Ainda na opinião de Petrucce, uma das maneiras para reduzir os riscos de morte às mulheres gestantes e puérperas, é fortalecendo este tema. "A gente precisa debater, esgotar esse assunto, fazer com que as pessoas saibam que existe, e a partir daí, criar uma conscientização. Duas das três principais causas podem ter sinais muito simples e de fácil reconhecimento, que são; sangue, febre e pus. Todo mundo sabe reconhecer sangramento e febre", alerta.
É preciso voltar os olhares e cuidados à mulher
Mesmo com a chegada de uma nova vida, a atenção e os cuidados precisam permanecer voltados, principalmente, à mulher que já está aqui. Isso porque no período de gestação e pós-parto, o organismo da mulher passa por uma série de mudanças, fazendo com que ela seja mais suscetível, por exemplo, a infecções urinárias, corrimentos, infecções e várias outras doenças do organismo, como pressão alta, diabetes gestacional, alterações da tireoide, entre outras doenças.
Segundo explica o médico ginecologista, isso ocorre por conta das mudanças de produção de hormônios, metabolismo, e as demais modificações que acometem o corpo. "A mulher fica mais propensa a doenças como um todo", afirma. Mas como identificar tais enfermidades? Luiz Fernando Petrucce destaca as principais variações fisiológicas, e alerta: a hipertensão costuma ser mais silenciosa.
- Consultas frequentes, rotina de pré-natal, um sistema de saúde que seja eficaz no sentido de conseguir atender as demandas das mulheres, para que após o parto elas consigam já ter uma consulta agendada, poder medir a pressão.
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Hemorragia e infecção costumam ter sintomas, e são identificadas, principalmente, por febre ou pus.
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Se a mulher está no pós-parto e está com febre, pode ser uma infecção. E hemorragia é sangramento. Então, são identificadas, principalmente, pela febre, saída de pus e sangramento.
Pandemia da Covid-19 agrava a mortalidade materna
Não dá para não citar o momento de crise sanitária que o Brasil vive por conta da pandemia do novo coronavírus. Com isso, as grávidas e puérperas acabam correndo mais um risco de vida, além dos já citados nesta reportagem.
A Febrasgo ressalta que a Covid-19 tornou-se a principal razão de óbitos de gestantes em 2020 e caminha para repetir o cenário neste ano. De acordo com dados do Observatório Obstétrico Brasileiro COVID-19 (OOBr Covid-19), ao longo dos 14 meses de pandemia, 1149 gestantes e puérperas faleceram em decorrência do vírus. Mas não é apenas a contaminação da doença que agrava a situação, lembra a obstetra Dra. Rosiane Mattar.
"Paralelamente ao receio de se contaminarem, os adiamentos de consultas, menor acesso a opções contraceptivas e eventual redução de atendimentos ambulatoriais para acompanhamento de comorbidades contribuem para vulnerabilidade das mulheres gestantes ou que acabaram de parir".
Vale lembrar que apesar de os Núcleos de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres apontarem ainda em junho do ano passado, que as mulheres grávidas corriam maiores riscos por questões ligadas à Covid-19, o Ministério da Saúde incluiu as grávidas e puérperas como um grupo de risco para fazer parte do PNI (Programa Nacional de Imunização), somente em abril deste ano – com exceção das gestantes com comorbidades, que foram inclusas no dia 15 de março.
“A Febrasgo adverte que a infecção pela COVID-19 em gestantes e puérperas está associada a um risco elevado de complicações e mortalidade. A suspensão da vacina Astrazeneca/Oxford foi resultado de monitoramento, de efeitos aversos que podem estar associados ou não a essa vacina.”
*Fonte: MS/SVS/CGIAE - Sistema de Informações sobre Mortalidade - SIM
*Ana Beatriz Gonçalves é jornalista e repórter do Papo de Mãe
Mortalidade materna: por que não estamos falando sobre isso? - Papo de Mãe
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