Definitivamente, não é possível entender de forma mais profunda o corpo humano sem unir o conhecimento de diversas disciplinas complementares.
Recentemente, li uma pesquisa bem interessante de Herman Pontzer, professor de antropologia da Universidade de Duke (EUA). Ele observou o gasto calórico de macacos selvagens e, para sua surpresa, esse gasto era equivalente ao de um aposentado que mora no Caribe, segundo suas próprias palavras. No entanto, o peso corporal desses macacos é saudável e estável, apresentando um baixíssimo índice de gordura corporal.
Pontzer ainda notou que todos os tipos de macacos, grandes ou pequenos, passam dez horas por dia descansando, catando insetos nos pelos e comendo, antes de dormir por nove ou dez horas, à noite. E quanto às subidas nas árvores e os exercícios físicos? Ele descobriu que os macacos escalam cerca de 100 metros por dia, o que proporciona um gasto calórico equivalente a uma caminhada de 1,5 km.
Se a atividade física não colabora de forma decisiva no emagrecimento, como sustenta o professor Herman, para que ela serve então? Vamos por partes!
O canto da sereia
A internet potencializou um fenômeno nocivo e perigoso, dando voz e visibilidade a qualquer aventureiro, permitindo a propagação de mentiras e mitos que vão contra a nossa saúde corporal.
Recentemente, fiquei assustado ao navegar no YouTube e assistir a alguns vídeos patrocinados, que afirmavam, de uma forma científica bastante convincente, que para perder peso você deveria esquecer o treinamento cardiovascular e fazer treinamentos intervalados de alta intensidade, a moda apelativa e marqueteira dos últimos anos.
O lobby bilionário de grandes players do mercado se esforçou para convencer você de que esse tipo de treinamento seria a melhor maneira de acelerar a perda de peso, de uma forma milagrosa.
No entanto, esse argumento esbarra em uma realidade cruel: o modelo de treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT), que seria, teoricamente, na prancheta de alguns pesquisadores, uma boa maneira de perder peso, não é indicado para quem está acima do peso, pois aumenta radicalmente o risco de lesões, além dos riscos cardíacos, entre outros.
Esse modelo ainda dificulta enormemente aquilo que, no fim, é o mais importante para a saúde: a adesão ao treinamento por um longo período, já que obriga o aluno a passar por sofrimentos físicos indescritíveis, colaborando com a aversão e a intolerância ao exercício.
Para chegar a essa conclusão, mais do que evidente, apenas consultei alguns dos maiores especialistas em áreas complementares do conhecimento corporal: a ortopedia, a fisioterapia e a cardiologia, podendo, assim, desenvolver uma visão integrativa e profunda dessa questão. A nova era do treinamento físico vai estimular a integração entre áreas complementares que não se comunicam.
Ao contrário do que o ensinaram, o treinamento cardiovascular é infinitamente mais importante que o treinamento muscular, invertendo a pirâmide do treinamento, como sustento ao final do meu último artigo: "Fitness não é saúde!"
É preciso acrescentar algo importante: não acredite em pessoas que prometam resultados milagrosos ou prometam acelerar a perda de peso por meio de exercícios físicos, suplementos, dietas radicais ou qualquer outra coisa.
Cuidado com o "canto da sereia" do treinamento físico, cuidado com o "caça níquel" sedutor do mercado do emagrecimento! De cara, essa seria a melhor maneira de separar o "joio do trigo", os oportunistas dos profissionais sérios e competentes.
O que você precisa saber
O primeiro ponto é que perder peso depende de diversos fatores, como ter boas noites de sono, controle do estresse e da ansiedade, estilo de vida, fatores psíquicos, emocionais, alimentação equilibrada, entre muitos outros. Ou seja, não é possível atacar um fenômeno extremamente complexo e multifatorial caso essa abordagem não seja multidisciplinar e terapêutica.
Segundo ponto, colaborar na perda de peso é uma consequência natural de um treinamento saudável e eficiente, mas não deveria ser o foco, porque, nem de longe, é o principal benefício dessa atividade. Se pudéssemos fazer uma lista, a perda de peso apareceria apenas nas últimas colocações dos benefícios que o exercício traz a você.
Veja a conclusão final do estudo com os macacos citado no início do texto:
"Todas as evidências atuais indicam um outro modo de enxergar a atividade física. Desde a década de 1980, o exercício é vendido como uma forma de perder peso, mas o exercício não é opcional, ele é essencial a todo o nosso sistema orgânico. A perda de peso é provavelmente o único benefício à saúde que ele não consegue gerar de uma forma efetiva.
A nossa herança evolutiva moldou nosso organismo para exigir uma atividade física diária e, consequentemente, o exercício não faz nosso corpo acelerar seu funcionamento tanto quanto o faz funcionarem melhor.
Diversas pesquisas mostram que a atividade física tem pouco efeito no gasto energético diário —caçadores coletores, como os Hadza, queimam o mesmo número de calorias diárias que um ocidental sedentário.
No entanto, o exercício regula a maneira como o nosso corpo gasta energia e coordena processos extremamente vitais ao ser humano, em todos os setores, desde o fortalecimento do sistema imunológico, passando pela diminuição do cortisol, reduzindo a inflação crônica, prevenindo as principais doenças modernas, as cardiovasculares, o diabetes e o câncer, além de produzir enzimas que ajudam a limpar a gordura do sangue circulante, entre centenas de outros mecanismos regulatórios.
Não é de admirar que populações como os Hadza não desenvolvam doenças cardíacas, diabetes, ou quaisquer outros males que afetam as nações industrializadas.
A lição de grupos como os Hadza é que a quantidade de exercício importa mais que a intensidade. Eles se mexem da aurora ao começo da noite, totalizando mais de duas horas de atividade por dia, a maior parte na forma de caminhada.
Podemos emular esses hábitos ao caminhar, pedalar, subir escadas, encontrando formas de trabalhar e ficar mais ativo, que nos façam diminuir o tempo sentado.
Uma pesquisa recente, feita com funcionários do correio de Glasgow, mostrou que funcionários que trabalham mais em pé, ficando mais ativos, tinham uma saúde melhor e nenhuma doença metabólica." (Herman Pontzer)
O que vem rápido vai embora rápido!
Para finalizar, na minha opinião, a atividade física tem um papel determinante na manutenção e na perda de peso corporal, sendo o mais potente ansiolítico existente no mercado. Porém, ela deveria ser praticada de uma forma moderada, orgânica e natural, sem pressa, tirando o foco nos resultados estéticos.
O problema de colocar o foco na estética é que, além de desvirtuar o processo, estimulando exageros e agressões ao seu corpo que você não deveria fazer, caso os resultados não apareçam logo, conforme o prometido na propaganda, o aluno desiste, abrindo mão daquilo que, no fim, seria o mais importante: regular todo o seu sistema orgânico, incluindo o peso corporal.
O que confunde os pesquisadores é que o maiores benefícios da atividade física não estão relacionados ao gasto calórico diário e, na verdade, são indiretos, como regular a qualidade do sono, moderar o apetite e a ansiedade.
Não coloque o carro na frente dos bois: busque saúde, e, como consequência, o seu peso corporal retornará ao seu equilíbrio, devagar, sem pressa, naturalmente.
Repito, de uma vez por todas, não existe uma solução milagrosa que vai acelerar a perda de peso corporal —e, se um dia inventarem tal medicamento, não compre, pois, com certeza, ele vai causar graves efeitos colaterais ao seu organismo, indo contra todas as determinações biológicas que moldaram a evolução humana durante milhões de anos.
O seu corpo não foi programado para perder peso de forma acelerada, logo, ele irá evitar isso a todo custo.
Você até pode perder peso com rapidez, mas isso não será sustentável no médio e longo prazo. Tudo que vem rápido vai embora rápido!
Já está provado, 95% das pessoas que fazem dietas radicais voltam ao peso anterior ou ganham ainda mais peso no prazo de um ano. Ou seja, perder peso rapidamente é provavelmente a forma mais ineficiente possível de manter-se magro.
O pior é que não adianta nada te falar isso, a nossa cultura é baseada na pressa e no imediatismo, sustentando indústrias bilionárias direcionadas a explorar esse nicho de mercado, vendendo soluções nocivas à saúde pública.
Assim como uma lâmpada mágica, o cliente pede aquilo que é impossível. Rapidamente, aproveitando a deixa, o mercado acena que descobriu uma nova forma de entregar essa promessa, desviando o cliente do caminho da saúde. Dessa forma, a obesidade é alimentada nas duas pontas: pelos hábitos modernos e, indiretamente, pela "indústria da saúde", gerando um círculo vicioso perverso que se autoalimenta.
Qual vai ser a próxima moda de dieta ou treinamento a te seduzir com resultados rápidos e milagrosos? Quanto tempo ainda as pessoas vão insistir nesse beco sem saída, perpetuando o efeito sanfona?
O equilíbrio está no meio, não nos extremos.
O mercado só muda se você mudar!
A atividade física não serve para perder peso - VivaBem
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