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Saturday, May 8, 2021

Doenças associadas à síndrome pós-Covid-19 vão ampliar busca por saúde pública - CNN Brasil

Leitos de UTI no Hospital Ronaldo Gazzola, na zona norte do Rio de Janeiro
Leitos de UTI no Hospital Ronaldo Gazzola, na zona norte do Rio de Janeiro, durante pandemia da Covid-19
Foto: Wilton Júnior/Estadão Conteúdo (10.mar.2021)

As várias sequelas neurológicas, cardíacas, pulmonares, renais e metabólicas observadas em pessoas diagnosticadas com Covid-19, o que cientistas estão chamando de Covid longa ou síndrome pós-Covid, devem se tornar um desafio para os sistemas de saúde de todo o mundo.

Isso porque a síndrome caracterizada por um conjunto de sinais e sintomas que podem persistir por mais de três meses após o diagnóstico da Covid-19 leva à necessidade de tratamentos e reabilitação - temporários ou vitalícios. 

Uma pesquisa publicada na revista Nature em abril indica que a Covid longa deverá ter um grande impacto no sistema de saúde dos Estados Unidos (EUA) nos próximos anos. O levantamento realizado pela Universidade de Washington, nos EUA, com 87 mil pessoas infectadas pelo novo coronavírus, confirmou que, apesar de ser inicialmente um vírus respiratório, as sequelas do Sars-CoV-2 podem afetar quase todos os sistemas orgânicos do corpo. 

Os autores avaliaram 379 diagnósticos de doenças possivelmente relacionadas à Covid-19 nos EUA (veja quadro). Para esses pacientes, foram prescritas 380 classes de medicamentos e realizados 62 tipos de exames laboratoriais. Diante de tal proporção, o coordenador do estudo, Ziyad Al-Aly, escreveu que "não é exagero dizer que as consequências de longo prazo da Covid-19 para a saúde serão a próxima grande crise de saúde dos Estados Unidos”. 

Efeitos prolongados da Covid-19
Efeitos prolongados da Covid-19
Foto: Arte/CNN Brasil

Outro estudo sobre Covid longa feito com 47 mil pacientes do NHS, o sistema público de saúde do Reino Unido, mostrou que quase um terço dos pacientes com Covid-19 que haviam sido internados com a doença foram readmitidos ao hospital, e um em cada dez morreu em virtude de sequelas causadas pela infecção.  

A pesquisa ressaltou a necessidade de tratamentos multidisciplinares. “O diagnóstico, o tratamento e a prevenção da síndrome pós-Covid requerem abordagens integradas em vez de abordagens específicas de órgãos ou doenças”, destacou o documento assinado por Daniel Ayoubkhani, estatístico do Escritório de Estatísticas Nacionais (ONS) do Reino Unido.

Impactos no Brasil

Ainda não há dados sobre as consequências da síndrome pós-Covid no Brasil, mas especialistas consultados pela CNN acreditam que ela pode sobrecarregar ainda mais o Sistema Único de Saúde (SUS), “que já sofre com falta de leitos, de profissionais e de equipamentos”, afirma a epidemiologista Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

A epidemiologista afirma que o SUS tem a estrutura necessária para os atendimentos dos casos da síndrome pós-Covid, mas para que dê conta de uma demanda crescente, é necessário receber mais recursos. 

Silva lembra que houve cortes no orçamento da saúde para 2021, o que, segundo ela, deve comprometer a gestão de combate à pandemia de Covid-19. “A maior preocupação é o financiamento proposto para a saúde, que é menor do que o de 2017 [R$ 127 bilhões, segundo o governo Federal], que já era insuficiente, e não está considerando todas as condições de pandemia, além dos outros fatores que vão impactar”, afirma.  

O orçamento de 2021 do Ministério da Saúde ficou em R$ 125 bilhões, R$ 2,3 bilhões a menos que o previsto. O valor também é menor do que os gastos da pasta em 2020, que ultrapassaram os R$ 160 bilhões. 

A presidente da Abrasco ressalta que a lotação de hospitais por causa da pandemia represou demandas e atrasou tratamentos de pacientes com câncer e de doentes crônicos, que tiveram cirurgias canceladas ou atendimentos adiados. Silva diz que esta população sofrerá ainda mais com a falta de recursos se aumentar o montante de pessoas com sequelas de Covid-19.

“Faltam condições para contratar mais médicos, enfermeiros e fisioterapeutas que possam fazer a assistência especializada, e depois um acompanhamento, com foco na atenção primária”, conclui.

Para Gustavo Matta, pesquisador da Escola de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Brasil deveria seguir os exemplos dos países que estão se preparando para as novas necessidades, como os do Reino Unido, a Alemanha e os Estados Unidos, que primeiro incentivaram o distanciamento social e hoje investem na vacinação em massa para contenção do vírus.  

“A crise que estamos vivendo não é somente sanitária, mas afeta diversas dimensões da proteção social brasileira, incluindo o sistema de saúde. Precisamos reagir a isso, planejar para antecipar o impacto da Covid longa”, afirma.

Preparar o SUS para essa nova realidade deve contemplar pelo menos duas ações conjuntas, aponta o pesquisador. A primeira envolve a contenção de casos de Covid-19 através da vacinação, do distanciamento social, e da reabertura epidemiologicamente orientada da economia e dos espaços sociais, com ações coordenadas regional e nacionalmente.

A segunda é criar um plano emergencial de recuperação e fortalecimento do sistema de saúde na atenção primária e em sistemas de proteção e segurança, por meio de programas sociais, já que a pandemia atinge ainda mais a população pobre

“Necessitamos de ações de proteção à saúde nos níveis mais próximos da população para evitar que se sobrecarregue a atenção hospitalar. E isso passa por investimentos na atenção básica. Só assim se evita mais cirurgias e mortes”, afirma.

Na próxima quarta-feira (12), o CNN Sinais Vitais, apresentado pelo dr. Roberto Kalil, um dos mais renomados cardiologistas do país, irá abordar o tema. O programa vai ao ar às 22h30, após o Jornal da CNN.

O que diz o Ministério da Saúde

Em nota enviada por e-mail à CNN, o Ministério da Saúde informou que o orçamento de 2021 foi encaminhado pelo Poder Executivo respeitando a regra de cálculo da aplicação mínima em saúde.

“No decorrer deste exercício, foram abertos créditos extraordinários para o enfrentamento à pandemia no valor total de R$ 10,9 bilhões. Além disso, foram reabertos créditos extraordinários de 2020 no valor de R$ 21,6 bilhões para aquisição de vacinas", segundo o texto.   

Em relação ao atendimento de pacientes em recuperação da Covid-19, o Ministério afirmou que o SUS possui 226 Centros Especializados em Reabilitação Física e Intelectual (CER) que prestam assistência aos pacientes em recuperação da Covid-19 em 26 estados, além de 38 oficinas ortopédicas e oito itinerantes. Também disse que o Governo Federal repassa, mensalmente, cerca de R$ 50 milhões para a manutenção e qualificação desses serviços. 

A pasta afirma que, em novembro de 2020, lançou o projeto Reabilitação Pós-Covid-19 (REAB) em cinco hospitais do SUS, em cada região do país: Hospital Municipal de Contagem (MG), Hospital de Palmas (TO), Hospital de Base de Brasília (DF), Hospital Geral de Fortaleza (CE) e Hospital Geral do Trabalhador (PR).  “O REAB apresentou um aumento de 26% na evolução dos pacientes em relação a independência motora e funcional. Mais dez hospitais públicos participarão do projeto ainda este ano”, diz a nota.

Sobre os investimentos em atenção básica, o Ministério afirma que, em 2020, o programa Previne Brasil, repassou para municípios e Distrito Federal cerca de R$ 20,8 bilhões para manutenção dos serviços de assistência na Atenção Primária. “Um aumento de 12% com relação a 2019. E que em 2021, já foram repassados mais de R$ 5 bilhões de crédito extraordinário”, finaliza.

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